domingo, 15 de março de 2009

Anexo ao texto publicado na Folha de hoje

Foto Pete Souza, White House

Concluí o texto abaixo para a Folha quinta à noite. Hoje, diante da profusão de artigos e comentários de blogs sobre o encontro Lula-Obama e a conferência de imprensa dos dois na Casa Branca, vale a pena anexar alguns pontos.

Quando dois chefes de Estado conversam há uma parte do papo que é reservada, com os intérpretes mas sem assessores (houve meia hora de conversa assim). Em seguida, as delegações combinam o que vão dizer para a imprensa. O assunto da normalização das relações com Cuba, que Celso Amorim na entrevista no Estadão julgava “inevitável” na pauta da Casa Branca, não foi comentado na coletiva. Mas não quer dizer que não tenha sido discutido. No encontro havia James Steinberg, subsecretário de Estado, o general James Jones, do Conselho de Segurança Nacional (NSC), Thomas Donilon, vice no NSC, Dan Restrepo, assessor para o Hemisfério Ocidental do NSC e Larry Summers. Ou seja, o vice de Hillary (Steinberg), o principal assessor econômico (Summers) e três membros do NSC, gente paga para seguir perto países complicados como Cuba, Venezuela e Bolívia. De todo modo, Cuba é um tema sensível na política externa e interna americana: ninguém imaginava que Obama fosse evocar o assunto numa entrevista coletiva com um chefe de Estado estrangeiro.

Outro ponto: antes de chegar à Casa Branca, Lula se reuniu com um velho amigo, John Sweeney, sindicalista que preside o AFL-CIO, a mais poderosa organização sindical americana, com 10 milhões de afiliados, cujo apoio é fundamental para o Partido Democrata e para Obama, sobretudo numa crise dessas (só topei com esta notícia depois de ter enviado meu texto). Lula é o único chefe de Estado que goza de uma rede própria de contatos e amizades nos sindicatos do mundo inteiro (fez sua primeira viagem ao exterior, ao Japão, em 1973, como dirigente metalúrgico). Isso conta muito no trânsito de Lula nos países da Europa Ocidental e no Japão. Não contava nada nos EUA no tempo de Bush. Mas conta bastante no governo Obama. A imprensa brasileira não deu a menor pelota para o encontro de Lula com presidente do AFL-CIO, nem entrevistou Sweeney, cuja importância cresceu no governo de Obama, que o recebe frequentemente na Casa Branca, como sublinhou o New York Times. Não tenho a menor dúvida de que a conversa de Lula com Sweeney amaciou a conversa de Obama com Lula

Enfim, uma ponto interessante sobre a imigração brasileira nos EUA. Fragmingham, cidadezinha do Massachussets, ressuscitada econômicamente por imigrantes brasileiros que hoje são uma minoria-maioria, recebeu os primeiros policiais americano-brasileiros formados na Boston Police Academy. É uma nova etapa da evolução das duas últimas décadas que transformou o Brasil num país de emigração. Yes, we have latinos!

P.S. – O encontro com Lula ganhou mais repercussão porque a coletiva incluiu uma resposta de Obama a uma pergunta crucial do primeiro-ministro chinês, Wen Jiabao, sobre a garantia ao trilhão de dólares que a China investiu na economia americana.

3 comentários:

Claudia disse...

Felipe,

Vamos combinar que 'complicados' são os EUA.

Encontrinho mais meia boca esse, nada de sensacional para merecer tanto espaço. Obama continua obediente e fiel a lógica democrata mais tradicional.

Obama finge não querer protecionismo, mesmo protegendo e Lula finge ser obediente, mesmo sendo desobediente e querendo é mais. Um saco! Detesto esta hipocrisia toda, uma falsidade e o pior é que a midia inteira só fala nisso, e até você.

C.

Claudia disse...

Felipe,

estava lendo o Sergio Dávila como quem não quer nada e ele estava contando que o Obama gargalhou das muitas piadas que o Presidente Lula contou durante visita aos EUA, algumas apenas parcialmente traduzidas pelo intérprete já que não tinham tradução para o idioma.

Dávila lembrou que Lula faz piada o tempo todo e que também levava Bush as gargalhadas marcando presença com uma piada sobre os países acharem o Ponto G.

Acho o piadismo de Lula saudável, não o recriminaria jamais por isso, pelo contrário, acho louvável.

Voltei no assunto pois você criticou a gargalhada do governador do Rio numa foto onde o Presidente Lula está exibindo uma luva na mão onde falta um dedo. Aquela cena é uma cena comum ao redor do Presidente Lula, uma cena totalmente de acordo com o estilo do Presidente.

O governador do Rio, assim como autoridades de todo o mundo, riu da piada do Presidente.

Queria frisar que não é por falta de boas maneiras que o Governador do Rio deve ser criticado.

Abraços,

C.

Gisèle disse...

Havia lido e reli.

Penso: que importante foi a posse de Obama. Historicamente um bom momento em resposta a subjugação, escravidão, preconceito e de quiçá, o que tem por vir. Mas um Nobel da Paz? Difícil, né?
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Ver foto de Jean-Marc Bouju em março de 2003, no texto http://ow.ly/168FE Foto de Jean-Marc Bouju: pai abraçando seu filho em um campo de prisioneiros durante a guerra EUA x Iraque, guerra esta que ainda perdura. Seria interessante pensarmos na escolha do atual ganhador do prêmio Nobel da Paz - o mantenedor de duas guerras atuais.