Há tantas coisas pra aprender sobre o Brasil que até o modo de aprender faz a gente aprender coisas.
Veja-se, por exemplo, duas notícias da Folha a respeito do censo populacional organizado pelo IBGE. A primeira informa que o uso de computadores de mão com GPS - grande novidade do atual censo – está dando problemas no Norte e no Nordeste. A nova tecnologia trouxe recenseadores mais qualificados que têm menos facilidades para se relacionar com a população do interior. Segundo Maria Wilma Garcia, coordenadora do censo, os novos recenseadores vem do meio urbano e desconhecem as pessoas com quem estão lidando.
"Perdemos os caboclos da região porque eles não sabiam mexer nos computadores. Antes, eles pegavam a pastinha, caíam no mundo e voltavam depois de um mês com tudo pronto. Andavam a pé, a cavalo, de bicicleta, pegavam carona, dormiam nas casas das pessoas e eram conhecidos de todos." É uma frase bonita com um sentido triste. O recenseador “caboclo” entretinha com os habitantes a proximidade cultural que legitimava a demanda do IBGE, do poder público. Mal treinado, mal instruído pelo Estado ele perde o emprego, é excluído e o recenseamento empaca.
A segunda notícia, vem da reporter Malu Toledo, e descreve outra situação em que os agentes do IBGE não conseguem preencher os dados e atrasam o censo: os moradores de condomínios de alto padrão em São Paulo (como Alphaville), em Teresina e em Maceió, não deixam os recenseadores entrar ou recusam-se a falar com eles (assinante UOL clique aqui)
É do balacobaco!
O tal do Abadia, megatraficante colombiano, comprou palacetes nestes condomínios com dinheiro vivo – prática perfeitamente ilegal segundo a procuradoria federal - e tudo estava nos conformes. Nenhum grupo de proprietários ou administrador de condomínio botou defeito. Mas o funcionário público, no exercício de uma atividade elementar para o bom funcionamento da cidadania e do Estado, é barrado na porteira do condomínio. Durma-se com um capitalismo destes!
A antropóloga Teresa Caldeira, que foi minha colega nos bons tempos do Cebrap, tem um importante livro sobre o assunto e escreve com propriedade: “Não é a cidade, por maior e mais diversa que seja, que se deve temer, mas sim a ausência de uma ordem pública e do respeito aos direitos dos cidadãos. Minar essa ordem para construir enclaves privados não pode dar mais do que a ilusão de proteção. A proteção ou é coletiva ou não será”.
Veja-se, por exemplo, duas notícias da Folha a respeito do censo populacional organizado pelo IBGE. A primeira informa que o uso de computadores de mão com GPS - grande novidade do atual censo – está dando problemas no Norte e no Nordeste. A nova tecnologia trouxe recenseadores mais qualificados que têm menos facilidades para se relacionar com a população do interior. Segundo Maria Wilma Garcia, coordenadora do censo, os novos recenseadores vem do meio urbano e desconhecem as pessoas com quem estão lidando.
"Perdemos os caboclos da região porque eles não sabiam mexer nos computadores. Antes, eles pegavam a pastinha, caíam no mundo e voltavam depois de um mês com tudo pronto. Andavam a pé, a cavalo, de bicicleta, pegavam carona, dormiam nas casas das pessoas e eram conhecidos de todos." É uma frase bonita com um sentido triste. O recenseador “caboclo” entretinha com os habitantes a proximidade cultural que legitimava a demanda do IBGE, do poder público. Mal treinado, mal instruído pelo Estado ele perde o emprego, é excluído e o recenseamento empaca.
A segunda notícia, vem da reporter Malu Toledo, e descreve outra situação em que os agentes do IBGE não conseguem preencher os dados e atrasam o censo: os moradores de condomínios de alto padrão em São Paulo (como Alphaville), em Teresina e em Maceió, não deixam os recenseadores entrar ou recusam-se a falar com eles (assinante UOL clique aqui)
É do balacobaco!
O tal do Abadia, megatraficante colombiano, comprou palacetes nestes condomínios com dinheiro vivo – prática perfeitamente ilegal segundo a procuradoria federal - e tudo estava nos conformes. Nenhum grupo de proprietários ou administrador de condomínio botou defeito. Mas o funcionário público, no exercício de uma atividade elementar para o bom funcionamento da cidadania e do Estado, é barrado na porteira do condomínio. Durma-se com um capitalismo destes!
A antropóloga Teresa Caldeira, que foi minha colega nos bons tempos do Cebrap, tem um importante livro sobre o assunto e escreve com propriedade: “Não é a cidade, por maior e mais diversa que seja, que se deve temer, mas sim a ausência de uma ordem pública e do respeito aos direitos dos cidadãos. Minar essa ordem para construir enclaves privados não pode dar mais do que a ilusão de proteção. A proteção ou é coletiva ou não será”.
6 comentários:
Ô professor, o Brasil tá me fazendo lembrar os tempos da Idade Média, guardadas as devidas particulares. Especialmente no Rio de Janeiro, os grandes condomínios de luxo com equipamentos hi-tech de segurança fazem suas próprias leis e sua própria ordem privada. O que é isso senão uma espécie de feudo? E não é demais lembrar também que na Idade Média o que mantinha a ordem social era o poder autoritário e bárbaro dos cavaleiros... Pra onde estamos caminhando?
salve, mestre luiz
eu já acho delicioso que nosso grande IBGE esteja sendo capaz de aprender sobre o país que ele com tanto afinco se esmera em estudar... que possamos aprender a lição a respeito de nossos necessários "mediadores" - sem um bom meio campo que ligue a retaguarda à vanguarda não vamos ganhar este jogo contra nós mesmos.
também acho fantástico o computadorzinho com gps pra investigar nossa perversa (grileiros e monocultura monossexual, como a chamou Gilberto Freyre) e maravilhosa (como a gente pode comer bem no Brasil, quanta coisa os camponenses daqui vêm nos oferecendo!) estrutura agrária: pense quando os dados estiverem disponíveis: muito trabalho pra nós, né?
e que os condoministas anti-ibge se alimentem com dvds, ipodes, tvsdeplasma, bolsasVH, camerasdesegurança-desuascamarasdemorteemvida etc...
me ajuda, mestre: como o açucar - este pó fininho e estimulante do metabolismo - era transportado no início? em barris? quando o algodão nativo começou a entrar no circuito, produzindo as toscas sacarias que até vinte anos atrás continuavam a imperar no meu porto de jaraguá(maceió)? sabia que quando foi inaugurado o novo terminal de embarque a granel (do caminhão direto pro porão do navio) foi feito um "acordo" com os 3.000 estivadores alagoanos no qual eles receberam 15 (QUINZE) anos de salário pra não entrarem na justiça? mas eu estou pesquisando os primeiros 50 anos do seculo vinte, quando as usinas comeram os engenhos e o agreste alagoano teve um lindo surto algodoeiro, com pequenos produtores dinamizando o comércio e graciliano ramos sendo prefeito de Palmeira dos Índios, a Princesa do Agreste... Pra história do relatório da comunidade quilombola que estou ajudando a "titular"...
eu não tenho imeio do gmail e não sei se é conveniente postar meu imeio profissional(incra) ou pessoal (uol) aqui: então, tomara ter uma resposta tua que me ajude.
grata
monica
ps - acabei de ler o coração das trevas. engraçado, é denso de humanidade, mas parece que não consegue dizer o que seria essencial ser dito.
Alo professor, digo sempre que ha vida inteligente no mundo virtual... Gostei muito do seu blog e gostaria de inseri-lo na minha lista de "blogs pelo mundo afora". De um retorno.Solange
Recenceadores munidos de GPS nos igarapés amazônicos: professor, lendo sua reflexão, lembrei de Marshal MacLuhan. O meio é a mensagem, lembra? - e quanto ele, o novo meio, seja a roda, o papel, a tv ou o GPS, quando ele chega, muda tudo.
professor... nem preciso dizer que gostei muito de sua prosa ontem no auditório do sesc paulista... maria rita nos apresentou e acho que sua fala renderá boa matéria prima para um programa de televisão... a propósito escreveu um post a respeito da conversa de ontem... está no meu blog, nesse endereço
http://todoprosa.blogspot.com/2007/09/o-ciclo-da-cana-de-acar-no-acabou.html
Pois, aqui em Assis, no interior de SP, eles não vieram à minha casa. Achei estranho!
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