sábado, 21 de março de 2009

VAI FALTAR AGUA MADAME!

Há 25 anos assistí em Paris, com uns amigos este programa da candidatura de René Dumont à presidência da França. No final, nossa tchurma vaiou o véio : a gente sabia tudo, a gente era mocinho, a gente era mitterrandista, a gente era pra-frentista ou anarquista, e ainda por cima bonitinhos: o papo dele era furado ! Mas o papo bateu na minha cachola: o véio tinha razão antes de todo o mundo: vai faltar água!! Alguns amigos que estavam lá comigo viraram logo depois ecologistas -, uma forma light mas consistente de anticapitalismo. Agora leio esta notícia no Estadão sobre o problema mundial da falta d'água e lembro de novo que o véio tinha razão. Salve René Dumont !!

7 comentários:

Anônimo disse...

Pois é, Luiz, a coisa anda tão feia que um dia depois da publicação dessa matéria no Estadão - que até poderia proporcionar a nós, brasileiros, uma certa "tranquilidade" em função da existência desse aquífero - eis que é publicado um outro estudo pela Fusp mostrando como o Estado de São Paulo está vulnerável a essa questão da água!!! (http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u538656.shtml)

E na França, a situação quanto ao abastecimento de água é encarado de que maneira, Luis??? já existe alguma região pensando em importar água????

Um grande abraço!!!!

Anônimo disse...

Prezado professor,

Antes de faltar água, antes de haver aquecimento global para subir o nível da águas e fazer o sertão virar mar, vai faltar é petróleo mesmo.

O fenômeno que explica essa escassez é conhecido internacionalmente por Peak Oil (Pico do Petróleo) ou Pico de Hubbert, em homenagem ao geofísico que o descreveu. O modelo se aplica a diferentes recursos finitos explorados sobre a terra.

Marion King Hubbert trabalhou na Shell. Foi um importante cientista no seu campo de conhecimento, ativista do Movimento Tecnocrático, influenciado pelas idéias econômicas de Frederick Soddy. Ele tornou pública em 1956 a previsão de que a produção americana de óleo nos 48 estados ao sul do Canadá entraria em declínio após 1970. Acertou na mosca. A produção dessa imensa província petrolífera vem caindo anualmente em concordância com o seu modelo.

Hubbert se esforçou para uma previsão do ciclo mundial do petróleo, tarefa dificultada por estatísticas não muito confiáveis como a que dispunha para o caso americano. Atualmente os seguidores de Hubbert estão divididos nas previsões que fazem. Há afirmações que já passamos pelo Pico, outras dão conta de sua iminência para o início da próxima década. A maior parte da produção de óleo vem de campos antigos que estão em declínio. O pico das descobertas se deu em 1964.

No vídeo abaixo aparece o Dr. M. King Hubbert expondo sua teoria. No final apresenta uma interessante concepção do papel dos combustíveis fósseis na história. Não se espante, a escala de tempo dos geólogos humilha qualquer historiador.
http://www.youtube.com/watch?v=UrW9Lm08UQQ

O historiador familiarizado com economias de ciclo extrativista não encontrará dificuldade em compreender o fenômeno. A história brasileira foi dominada por dois desses ciclos e conheceu outros de abrangência regional. A sequência de crescimento, apogeu e queda em atividades de mineração está suficientemente documentada, os problemas aparecem logo no início da queda. O petróleo passará por um auge e não há substituto para sua utilização. Isto, repito, não ocorrerá em décadas, mas nos próxinos anos, se já não ocorreu. Os problemas são iminentes e terão trágicas consequências. A médio prazo, o mundo terá que defrontar com decrescimento da riqueza produzida, inclusive na agricultura, e retrocesso na globalização.

Sugiro visitar a página da ASPO - The Association for the Study of Peak Oil and Gas ( http://www.peakoil.net/ ). Há uma seção francesa da ASPO, que conta com a colaboração de Yves Cochet ( http://www.yvescochet.net/wordpress/index.php ), ex-ministro do meio ambiente e hoje deputado verde eleito aí na onzième circonscription de Paris, com base no 14ème. Diz ele que o fim do petróleo não será o fim do mundo, mas que se trata do fim do mundo como conhecemos.

Frederick Soddy merece um comentário a parte.

Unknown disse...

Caro Professor
Três observações.
1ª) Realmente a água como commodity é hoje quase uma realidade. Basta ver a distância de onde é feita a captação de água para cidades como São Paulo (mais de 100 km de distância), San Diego e Los Angeles.
2ª) Quanto ao trecho: ecologistas -, uma forma light mas consistente de anticapitalismo, gostaria da exposição de maiores considerações.
3ª) Sobre as considerações de N R ALM sobre o Petróleo.
Não é contemplado o potencial de novas descobertas (ex: pré-sal brasileiro), ampliação das formas de extração dos campos preexistentes (injeção de gás carbônico e água pressurizada são exemplos). Sem dúvida nenhuma o petróleo é um recurso finito e não-renovável, mas como visão global, o pico de produção é difícil de ser apontado. Não considero correta que tomemos o caso estadunidense como uma referência definitiva sobre o assunto. Há quem afirme que a possibilidade de prospecção de novos campos e novas formas de produção são tão significativas quanto a produção hoje.
Saudações
Paulo F.

luiz felipe de alencastro disse...

Caro Paulo F

"ecologistas -, uma forma light mas consistente de anticapitalismo":
quer dizer que em nenhum lugar do planeta os ecologistas chegaram ao poder mediante a luta armada (via revolucionària), ou numa eleição que lhes desse maioria exclusiva no governo (via reformista, como os socialistas)
mas quer dizer também que, no meu entender, a ecologia é essencialmente anticapitalista.

um abraço
luiz felipe de alencastro

n r alm disse...

Prezado professor,

Permita-me que eu responda ao seu leitor Paulo F.

Prezado Paulo,

O caso americano é emblemático. A área dos 48 estados representa uma amostra estatística territorial significativa e representativa (5%) da superfície dos continentes, contendo terrenos ultra favoráveis a ocorrência de óleo conforme a história atesta; já produziu tanto petróleo quanto produz hoje a Rússia ou a Arábia Saudita e ainda é a terceira maior produtora do mundo; o EUA não tem problema de acesso a todas tecnologias que você citou para recuperar campos preexistentes; também tem ótimo mercado de capitais para financiar sua exploração; apesar de tudo isto, somando que é um país adito em petróleo, nas palavras de Bush, a produção desses campos segue em declínio, mesmo com as descobertas em águas profundas do Golfo do México não consegue deter a queda.

Com este quadro descrito acima para essa província tão rica em óleo, temos elementos para deduzir que o padrão logístico se reproduzirá no mundo. A curva de exploração de um recurso finito, como é o caso do petróleo, no início e no final passa por zero, é razoável supor que no intervalo exista um auge, ou pico.

No mundo outras áreas registram queda de produção. O México diminuiu sua produção depois que seu principal o campo, o segundo maior do mundo, entrou em declinio; o campo do Mar do Norte tem o mesmo problema e a Inglaterra já é importadora de óleo; a Indonésia também se tornou importadora e teve de abandonar a OPEP. Os exemplos são múltiplos. A figura abaixo mostra que o pico das descoberta ocorreu há 45 anos atrás e que o volume anual dos achados não repõe o extraído há quase 30 anos.

http://dangerousintersection.org/wp-content/uploads/2006/03/PeakOilDiscovery_op_800x489.jpeg

Os achados mais significativos recentes estão localizados em águas ultraprofundas, nas bordas continentais. São áreas de prospecção muito cara. Se as companhias vão para lá, isto sinaliza que elas não têm muita expectativa nas áreas de terra firme ou águas rasas. Estão partindo para as últimas fronteiras geológicas do petróleo.

O petróleo não acabará num jato. Seria uma tragédia se o modelo de esgotamento fosse assim; toda infraestrutura e indústria montada sobre ele também desapareceria num jato. O modelo de Hubbert permite que nos preparemos para transição. O ocaso do petróleo terá o impacto inverso da Revolução Industrial.

um abraço.

Paulo F. disse...

Prezados Professor e N R Alm.
Agradeço a atenção de ambos.

Ainda quanto ao petróleo. O gráfico é realmente elucidativo.
Uma das discussões a ser aberta é o fim do uso do petróleo como combustível, ficando seu uso "nobre" privilegiado (petroquímica).
Há também o paradigma da exploração em regiões polares. O que os estadunidenses fazem com a exploração no Alaska pode ser apenas uma prévia para o inicio da prospecção e exploração em áreas tidas hoje como santuários da preservação ambiental.
Saudações
Paulo

Zera Yacob disse...

Ecologia anticapitalista ?? Hoje é pasta de ministério em governos de direita (sarkozy) e argumento eleitoral para qualquer candidato em país desenvolvido. Ao contrário do que os véios defendem, a ecologia já foi recuperada pelas empresas, ong's e programas governamentais. A papo do al gore e a crise só aceleraram a dinâmica. Jovens, vamos guardar a paixão e enxotar as idéias dos véios, para formular um anarquismo adaptado ao nosso século.