Trabalhadores cativados numa olaria chinesa, foto Agence France-Presse — Getty Images no New York Times de 16/06
Há dias que eu queria chamar a atenção para três notícias recentes sobre os desdobramentos da globalização. Em primeiro lugar, o avanço da financiarização do capital através da atividade crescente dos fundos de investimento não cotados na Bolsa, ditos de private equity. Segundo Eric Le Boucher, um dos colunistas econômicos do Le Monde, no ano passado as Bolsas européias registraram a entrada de 716 empresas com um capital total de 85 bilhões de euros. No mesmo ano, os fundos de investimento de private equity investiram 71 bilhões de € em 7.500 empresas européias. Debates de especialistas na TV chamaram a atenção para o caráter especulativo destes investimentos, a opacidade que cobre suas atividades e o risco representado por mais esta etapa da desregulamentação capitalista. Apesar disso, Martin Wolf, um dos melhores comentadores econômicos da atualidade, faz um ponderado elogio desta nova fase de predominância do capital financeiro (a primeira foi na virada do século XIX).
Em segundo lugar, vem a pedreira do capitalismo chinês, cada vez mais caracterizado como um sistema truculento de exploração de mão-de-obra semi-servil. Assim, como escreveu um cronista do New York Times, a China aparece como a última grande ditadura capitalista do mundo.
Em segundo lugar, vem a pedreira do capitalismo chinês, cada vez mais caracterizado como um sistema truculento de exploração de mão-de-obra semi-servil. Assim, como escreveu um cronista do New York Times, a China aparece como a última grande ditadura capitalista do mundo.
Robert Fogel, o prêmio Nobel de Economia que é, também e sobretudo, um brilhante historiador econômico, escreveu um paper Capitalism and Democracy in 2040 (o texto completo aqui é pago, mas aqui está resumido), muito otimista sobre a China. Segundo ele, em 2040, o PIB da China será de 123 bi $, ou seja, 40% do PIB mundial, e perto de 3 vezes do PIB mundial de 2000. Àquela altura, o mercado chinês será maior que os mercados combinados dos EUA, da UEuropéia, da Índia e do Japão. Se for verdade resta acrescentar: Karálio! Olha o monstro capitalista que vem por aí! Fogel pensa que não vai haver quebradeira de bancos chineses, nem problemas políticos no país. Tudo isso por causa dos ganhos de produtividade acumulados com a passagem da população rural para as cidades e, principalmente, com os resultados dos investimentos maciços na educação (a grande vantagem da China sobre a India). Ele acha que tudo vai dar certo no meio tempo, porque a China tem boa experiência na cooptação das elites (Os jesuítas e dominicanos portugueses – como frei Gaspar da Cruz - idos à China nos séculos XVI e XVII, também se embasbacaram com a administração do mandarinato chinês, inaugurando assim a sinofilia ocidental, que ganhou a esquerda nos anos 1950-1970 e agora tem tantos adeptos na direita).
No entanto, faço minhas as restrições levantadas ao paper de Fogel pelo professor Tyler Cowen, economista reputado e editor de um blog bastante original: “Repete aqui comigo: a China no século XX teve duas grandes Revoluções, fases de fome generalizada, a Revolução Cultural e, alegadamente, o ditador mais tirânico de todos... E agora eles vão passar dos farrapos à riqueza sem ao menos um arroto nesta evolução econômica? Eu não penso que isso possa ser dito assim!”
Neste ínterim, na maioria dos países desenvolvidos, a globalização tem acentuado as desigualdades de renda, não somente em detrimento dos trabalhadores menos qualificados, mas também em prejuízo da classe média, como sugere um estudo recente da OCDE. Sim senhor! A classe média também se ferra: é só ver o comentário do Economist.
Em terceiro lugar, queria falar de uma noticiazinha que tem tudo a ver conosco. Cada vez mais está em uso a etiqueta RFID (Radio Frequency Identification). Enfiada em qualquer canto de uma mercadoria, ela ajuda as grandes marcas a combater a pirataria de suas grifes. Algumas boates na moda já tem um enfermeira na entrada que insere, sob a pele dos clientes que desejarem, a RFID. Aí, o cara paga suas bebidas, entra nas zonas reservadas, etc., sem ter que tirar a carteira toda hora. No México, já se achou outra utilidade para a RFID: enfiá-la na pele de crianças e adultos que podem ser vítimas de seqüestro. Com este xavecozinho fica mais fácil saber onde estão sendo seqüestrados.
Se alguém ler isto aqui e abrir uma firma do ramo no Brasil, eu quero uma comissão, hein!
Em terceiro lugar, queria falar de uma noticiazinha que tem tudo a ver conosco. Cada vez mais está em uso a etiqueta RFID (Radio Frequency Identification). Enfiada em qualquer canto de uma mercadoria, ela ajuda as grandes marcas a combater a pirataria de suas grifes. Algumas boates na moda já tem um enfermeira na entrada que insere, sob a pele dos clientes que desejarem, a RFID. Aí, o cara paga suas bebidas, entra nas zonas reservadas, etc., sem ter que tirar a carteira toda hora. No México, já se achou outra utilidade para a RFID: enfiá-la na pele de crianças e adultos que podem ser vítimas de seqüestro. Com este xavecozinho fica mais fácil saber onde estão sendo seqüestrados.
Se alguém ler isto aqui e abrir uma firma do ramo no Brasil, eu quero uma comissão, hein!
9 comentários:
Quanto aos Privete Equity, grande parte das empresas inovativas do Vale do Silício Americano são financiadas por esses grupos. Como li certa vez em um artigo: Inovação = Nerds + Dinheiro. Um sem o outro não funciona.
Já RFID não é mais uma grande novidade. Por exemplo, muitas fazendas de pecuária para exportação (principalmente para Europa) já usam para rastrearem o gado (o dito boi rastreado) com cotação da arroba maior que a do boi comum.
Em alguns outros países temos "pequenas" ditaduras capitalistas?
nao sei, mas vendo o caso da china e de seu crescimento não teríamos indícios desconfortáveis de uma espécie de futuro para o capitalismo?
sobre a China, uma vez ouvi uma frase do professor Gabriel Cohn q, ao meu ver, resume bem a situação.
"Na China, trata-se a vida humana da mesma forma q nós aqui no Brasil tratamos os recursos naturais, o meio ambiente: como um recurso abundante (não-escasso) cujo valor econômico, portanto, é praticamente nulo. E q pode ser descartado facilmente, sem grandes perdas para o capital". Triste verdade, não?
Eqto isso, os idiotas de plantão continuam tecendo loas ao crescimento econômico de China e Índia, sem atentar para os custos sociais dos dois processos históricos...
vai lá os donos do mundo criando os fins de si mesmo, mas é uma pena que antes disso eles nos matem
Um blog de força, 0 Sequências Parisienses (sem o trema, lamento, não achei no meu teclado) politicamente encorpado, seja lá o que queiras entender por isso. Gosto.
O jornalista Oldack Miranda, do Blog Bahia de Fato, um amigo querido, foi lá que achei referências (boas, naturalmente) ao Sequências.
Gostaria de ter o link daqui, no meu blog. Permisso?
No problem, Pasionaria, agradeço a atenção
Salve, professor.
O texto é tão brilhantemente lacônico que posso até construir uma pirâmide imaginária, como a de Maslow...
O capital...
Os governantes...
Religiões, seus deuses e igrejas...
As armadas...
Os burgos...
e finalmente...
o povo...lascadim, lascadim como sempre.
Professor, não dá para deduzir isso do gráfico da The Economist, mas é possível que a classe média não tenha necessariamente perdido, é possível que os milionários tenham simplesmente disparado na frente. Isso aconteceu na Inglaterra nos anos 90.
E temos que notar que os dados são sobre a OCDE. É preciso levar em conta a situação dos países pobres, quando falamos do efeito da globalização sobre desigualdade. Vou colocar um post hoje lá no blog sobre isso para quem se interessar pelos dados (não é propaganda, é que o texto é grande demais para a caixa de comentários :).
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