Tem sido notória a instabilidade eleitoral francesa. Nas presidenciais de 2002, todos os institutos de sondagem se enganaram no primeiro turno: Le Pen, e não Jospin, passou para o segundo turno vencido por Chirac com 82% dos votos. Porcentagem que por sí só já mostra a dimensão do disparate eleitoral. Agora surgem outras incertezas: três candidatos, Ségolène, Sarkozy e Bayrou embolam no final.
Alguns pontos para comprender o imprevisibilidade das presidencias francesas desde de 2002.
Em primeiro lugar, apesar de haver muitos candidatos, a equação das presidenciais tinha basicamente 4 parceiros: à direita, os gaullistas e os centristas, à esquerda, os socialistas e os comunistas. No segundo turno os dois eleitorados se juntavam em torno de seus respectivos líderes: a direita elegia gaullistas (De Gaulle em 1965, Pompidou em 1969, Chirac em 1995) ou centristas (Giscard d’Estaing em 1974), e a esquerda elegia socialistas com os votos do comunistas (Mitterrand em 1981 e 1988). Ao longo dos anos 1990, o Partido Comunista desabou, perdendo grande parte de seu eleitorado que constituia o tanque de reserva do candidato socialista no segundo turno.
O jogo agora tem essencialmente três parceiros, com os socialistas captando, sozinhos, a maioria dos votos de esquerda. Na extrema-esquerda, como na extrema-direita, um certo número de candidaturas congelam o voto de eleitores posicionados contra o sistema político ou ultra-nacionalistas, os quais, em boa parte, votam nulo ou se abstém (o voto não é obrigatório no país) no segundo turno.
Em segundo lugar, é preciso levar em conta os efeitos da vitória do “não” no referendo sobre a Constituição Européia, em 2005, que tirou o rumo dos partidos políticos. De fato, a direção dos três grandes partidos políticos e praticamente toda a grande imprensa, incluindo Libération, havia pregado o voto pelo “sim”. Desde então as direções partidárias estão inseguras sobre a orientação de seus filiados. Libération também pagou um preço por este desencontro com boa parte de seus eleitores, e este é um dos motivos da saída de Serge July da direção do jornal.
Os eleitores de esquerda que se abstiveram em 21 de abril de 2002 (quando Jospin foi eliminado no primeiro turno e Le Pen passou para o segundo turno) ou votaram “não” no referendo de 2005 sobre a Constituição Européia, ficaram pendurados na brocha. No plano nacional, não houve um agrupamento da extrema esquerda francesa. No plano europeu, o “não” acabou paralizando a construção européia e não deu em nada.
Desde logo, ninguém sabe direito o que vai acontecer nas eleições de abril.
O problema inédito de Ségolène Royal será o de carregar, praticamente sozinha, uma maioria eleitoral do primeiro para o segundo turno. No campo da direita, vai haver, a partir desta semana, um pega-pra-capar. Tudo indica que se Bayrou chegar ao segundo turno, ele reunirá os votos da direita e vencerá Ségolène. Mas ele perde a eleição se for para o segundo turno contra Sarkozy, pois não terá a maioria dos votos de esquerda. Além disso, seu eleitorado é mais volátil do que o dos outros dois candidatos e poderá, em parte, escolher Sarkozy no segundo turno. Assim, Bayrou deverá, a partir de agora, atacar prioritariamente Sarkozy. Ségolène poderá tirar proveito desta pauleira? Voltarei ao assunto.
2 comentários:
Felipe,
Acho que uma razao importante para melhor explicar esse marasmo eh o desinteresse por e a descrenca nos partidos politicos ditos tradicionais. Tanto os de esquerda quanto os de direita estao tao afastados da realidade dos eleitores que muitos ja nasceram acreditando que nao eh nas urnas que eles podem se fazer ouvir, a nao ser quando eh um referendum!
Conversar com meus sobrinhos(as) que moram em Paris e sao netos e filhos de militantes eh muito instrutivo: eles estao muito mais crentes e a vontade com acoes locais, pontuais, como cidadoes. Serah que isso ja nao eh uma tendencia na Franca? na Europa? As pessoas largando a atuacao politica (dah para se falar ainda em militancia?) tradicional e indo para movimentos populares em torno de temas?
Abraco,
Catou
Professor,
Creio que uma boa parte dos votos da Segolene ira para Bayrou se ele passar para o segundo turno com o Sarkozy. A esquerda odeia o Sarkô! Não se esqueça que a politica é feita também por paixões...
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