domingo, 26 de novembro de 2006
I - A natureza do escravismo brasileiro
No momento em que muitas cidades acabam de comemorar o feriado do Dia da Consciência Negra (veja-se o link), faz sentido recapitular a natureza histórica do escravismo.
Nenhuma parte do Novo Mundo conviveu com a escravidão em tão larga escala como o Brasil. Dos 11 milhões de africanos desembarcados nas Américas, 44% (perto de 5 milhões) vieram para o território brasileiro num período de três séculos (1550-1850). Os Estados Unidos, que praticaram o tráfico negreiro entre 1650 e 1808, receberam perto de 600.000, ou seja, 5,5% do total de africanos. De golpe, o Brasil aparece como o agregado político americano que captou o maior número de africanos e que praticou a escravidão durante mais tempo. Para completar, o Brasil foi o único agregado político americano que participou diretamente da pilhagem negreira na África : tanto na época colonial como no Império, negreiros, negociantes e militares vindos do Brasil empreitaram operações escravistas no interior do continente africano. E mais particularmente em Angola. Por isso, escrevi alhures, "a destruição constante de Angola se apresenta como a contrapartida da construção contínua do Brasil".
O historiador americano Dale Tomich procurou distinguir, de um lado, a escravidão articulada às economias européias dos séculos XVI-XVIII e, de outro lado, o escravismo mais recente conectado à Revolução Industrial. Assim, ele constata que a produção de algodão, açúcar e café para os mercados dos países industrializados oitocentistas, encaixou o escravismo do Sul dos EUA, do Brasil, de Cuba e de Porto Rico num quadro bancário, num processo produtivo (uso de máquinas, de transporte ferroviário e de navegação a vapor) e num mercado consumidor (com a participação crescente de classes médias e trabalhadoras européias e americanas), distintos e mais evoluídos que a inserção mercantil dos séculos anteriores.
Tomich está certo. Porém, ele privilegia fatores econômicos e sociais, abstraindo a esfera política, onde ocorre o impacto mais profundo da modernização do escravismo. Neste ponto, evidencia-se, mais uma, vez a singularidade brasileira.
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Um comentário:
O Brasil destruiu Angola para se construir. O padre Antônio Vieira ja dizia: sem Angola não ha Brasil.
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